Se assinalam os 125 anos da sua edição(Os Maias) e uma iniciativa Expresso (Eça Agora) veio chamar a atenção para a obra e a efeméride. De facto, o conhecido semanário oferece o romance, em très edições consecutivas, a que se seguirão, em outras três edições, textos de seis escritores atuais que "trazem" Os Maias até 1973- e um sétimo e último volume sairá um estudo, sobre o romance, do reputado especialista queirosiano Carlos Reis. Maria do Rosário Cunha, falará sobre a futura edição crítica de Os Maias. Kyldes Batista Vicente, sobre a minissérie da TV Globo que os teve por base- enquanto se lembram também suas adaptações ao teatro (bem como a falhada tentativa do próprio Eça), com o testemunho da encenadora Filomena Oliveira. E ainda o que pretende ser uma sua próxima adaptação ao cinema, em entrevista com o realizador João Botelho.
Os Maias no cinema como "retrato" do país
João Botelho
"Fazer cinema em Portugal é, neste momento, um privilégio. Por isso, só vale a pena fazer filmes importantes". É esta convicção, associada à vontade de explorar uma certa ideia de Portugal, que leva o realizador a adaptar Os Maias, cujas filmagens começam no outono.
" A escolha não teve nada a ver com a efeméride", diz João Botelho, referindo-se ao 125º aniversário da edição do romance, e ao conjunto de iniciativas a ela ligadas, nomeadamente Eça Agora, do semanário Expresso.
"Acho isso de 'de continuar' Os Maias um bocado pretensiosa", comenta. "O Eça inventa um final genial: depois da violência do incesto, o normal era Carlos dar um tiro na cabeça e Maria Eduarda ir para um convento. Ele tem esta ideia maravilhosa: Vamos mas é curtir para a Europa! Como é que se pode continuar isto? Esta abertura é um fecho", argumenta. No entanto, confessa-se curioso: "É esperar para ver o resultado. Vou querer ler, claro".
Os Maias -(Alguns) Episódios da Vida Romântica - o seu projeto de adaptação da obra-prima de Eça ao grande ecrã- remonta ao ano de 2011. Foi então que o apresentou ao concurso de apoio à produção cinematográfica do Instituto do Cinema e Audiovisual (ICA), mas os resultados só foram homologados no início deste ano. E o filme tem, finalmente, pernas para andar.
O realizador já assinou contrato com o ICA e além desse apoio (de 600 mil euros), o filme conta com outras fontes de financiamento como a Câmara Municipal de Lisboa e a ANCINE - Agência Nacional do Cinema, do Brasil, o que faz com que o orçamento ascenda a mais de um milhão de euros. Além da longa-metragem, que terá cerca de duas horas, haverá uma série televisiva de três episódios, de 50 minutos cada. As filmagens decorrem entre os próximos meses de outubro e dezembro, e a estreia está pensada para o outubro de 2014.
Uma História de Decacência
A pouco mais de dois meses do início da rodagem, João Botelho está, agora, na fase de pré-produção e mergulhado no 'caldeirão' de dúvidas e (algumas) certezas que é o processo criativo. "Será um filme abstrato", adianta. E o mesmo é dizer que não haverá qualquer pretensão de verdade. "Não se vai perceber a época - pode ser hoje ou daqui a 100 anos. Quanto muito, nota-se uma ideia da época. Não gosto nada do Naturalismo", diz. E explica: "No cinema é tudo falso. Ninguém morre no cinema: mato uma personagem e, no dia seguinte, ela está aqui connosco. Verdade é o que as pessoas sentem quando veem o filme- o tédio, a alegria, a tristeza, a inquietação".
Foi essa relação "falso/verdadeiro" que sempre lhe interessou. E que estará visível nos seus Maias. Desde logo, nos décors. Todos os exteriores serão filmados em estúdio (num grande hangar em Azeitão), e estão a cargo do artista plástico João Queiroz, que está a pintar Lisboa numa série de telas de grande dimensão. Os interiores, por sua vez, aproximar-se-ão mais dos espaços do livro. Estão já 'encontrados' alguns deles, como a Casa Veva de Lima (que será o Ramalhete), o Grêmio Literário ou o Palácio de Francelhos, todos em Lisboa. "O mais difícil está a ser achar a Toca", nota, com entusiasmo.
Além dos cenários, também a escolha dos atores foi pensada de acordo com esse 'ideal' de abstração. Pelo menos a dos protagonistas. "Queria pessoas menos conhecidas do grande público. 'Estranhas'. O ideal era fazer o filme com pessoas que nunca ninguém tivesse visto. Quero que vejam o Carlos, a Maria Eduarda, e não este ou aquele ator", explica. "O importante é que o texto literário prevaleça sobre o resto, sobre as pessoas que o interpretam", remata o cineasta, cuja obra é atravessada pela relação entre o cinema e a literatura (em filmes como Conversa Acabada, a partir de Mário Sá Carneiro e Fernando Pessoa; A Corte do Norte, de Agustina Bessa-Luís; Quem és Tu? uma adaptação de Frei Luís de Sousa; ou Filme do Desassossego, a partir do Livro do Desassossego, do semi-heterónimo de Fernando Pessoa, Bernardo Soares).
Entre os 54 atores que compõem o elenco, são já certos os nomes de Graciano Dias (Carlos da Maia); da brasileira Maria Flor (Maria Eduarda); Catarina Wallenstein (Maria Monforte); e Maria João Pinho (condessa de Gouvarinho). João Botelho avança outros, ainda por confirmar: Luís Miguel Cintra, Ana Moreira, Miguel Guilherme e Rita Blanco. "O mais difícil é o Ega! Ainda estou a fazer casting...O Ega é que é o génio. É ele que transporta o romance", observa.
A sua verdadeira inquietação prende-se, no entanto, com o conteúdo. "Os Maias dava um filme de 15 horas e eu vou fazer de duas para o cinema e de três para a televisão. Podia fazer uma longa inteira só a partir da descrição do Ramalhete", afirma. "O mais difícil é cortar sem ofender. Como é que se monta isto? Como é que se mantém uma cena e se tira outra?".
Já bem assente tem a sua leitura do romance e o que quer, a partir dele, explorar. "A história de amor de Carlos e Maria Eduarda é também a história do país. A decadência da família - que vai ao limite, que não deixa descendência- é a história da morte do país. Portugal morre quando Afonso da Maia morre. E o tédio de Carlos é o da aristocracia que acaba", diz. "Não vou separar as coisas".
Não só não as vai separar como quer explorar, sobretudo, essa "ideia de limite". De um país em decadência. O de 1800 e o de agora: "O país retratado n'Os Maias é muito semelhante ao de hoje, na definição dos comportamentos, na indiferença das pessoas que têm mais poder, no desespero dos mais pobres".
Entre os 54 atores que compõem o elenco, são já certos os nomes de Graciano Dias (Carlos da Maia); da brasileira Maria Flor (Maria Eduarda); Catarina Wallenstein (Maria Monforte); e Maria João Pinho (condessa de Gouvarinho). João Botelho avança outros, ainda por confirmar: Luís Miguel Cintra, Ana Moreira, Miguel Guilherme e Rita Blanco. "O mais difícil é o Ega! Ainda estou a fazer casting...O Ega é que é o génio. É ele que transporta o romance", observa.
A sua verdadeira inquietação prende-se, no entanto, com o conteúdo. "Os Maias dava um filme de 15 horas e eu vou fazer de duas para o cinema e de três para a televisão. Podia fazer uma longa inteira só a partir da descrição do Ramalhete", afirma. "O mais difícil é cortar sem ofender. Como é que se monta isto? Como é que se mantém uma cena e se tira outra?".
Já bem assente tem a sua leitura do romance e o que quer, a partir dele, explorar. "A história de amor de Carlos e Maria Eduarda é também a história do país. A decadência da família - que vai ao limite, que não deixa descendência- é a história da morte do país. Portugal morre quando Afonso da Maia morre. E o tédio de Carlos é o da aristocracia que acaba", diz. "Não vou separar as coisas".
Não só não as vai separar como quer explorar, sobretudo, essa "ideia de limite". De um país em decadência. O de 1800 e o de agora: "O país retratado n'Os Maias é muito semelhante ao de hoje, na definição dos comportamentos, na indiferença das pessoas que têm mais poder, no desespero dos mais pobres".
Fonte: JL
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