João da Ega: Memórias de um Átomo
Seis romancistas 'inventam' um início para o romance que a famosa personagem d'Os Maias desejava escrever e o sétimo imagina a sua estrutura.
2) Miguel Real
No princípio criou Deus os céus e a terra. E Deus fez-me como ser luminoso. De mim nasceu o primeiro luzeiro e brilhou a primeira luz.
Rompi as trevas que havia e viu-se, entre o abismo hiante das profundezas do Nada, a face de Deus pairando sobre as águas.
E disse Deus, haja luz. E houve luz. Por todos os céus estrelares penetraram as minhas vibrações incandescentes, aclarando os mais ínfimos vórtices de matéria. E luz houve, organizando o caos e banhando de claridade as trevas mais fundas do fundo sem fundo do universo. E com a luz, houve o Tempo, que desde então não cessou de se movimentar, consumindo-me a força vital. São os meus dois filhos, que me esgotarão a vida - o Tempo e o Movimento -, que patriarca um só tenho: Deus, meu Senhor e Criador. Eu, templo de matéria, seu escravo.
Chamou-me Deus à expansão da vida. Da luz nasce o calor, do calor a vida e a vida inundou a terra vazia e sem forma. Separou Deus o céu alvo e a terra escura e, como um berlinde nas mãos de uma criança, acionou a redonda terra, fazendo-a girar infinitamente até o longínquo limite dos tempos e das eras. Fui eu a primeira partícula a beijar de luz a sagrada terra, antes mesmo de esta para todo o sempre ser beijada pelo magnificente sol. Ao esplendor do sol chamou Deus dia e noite ao fulgor prateado da lua. E criou Deus os viventes do dia e os viventes da noite.
Eu, atraído pela potência do astro-rei, pairava a uma velocidade absoluta entre a terra e o sol, criando, na escuridão do vasto espaço gelado e imóvel, uma fímbria de luminosidade que atraiu o santo olhar divino. Por misericórdia, Deus libertou-me da minha prisão gravitacional. Senti-me projetado para a terra, arremessado para o centro da pupila de Adão, que, puro e virginal, lançava o primeiro olhar de desejo para as carnes roliças e ardentes de Eva.
Fonte: JL
Rompi as trevas que havia e viu-se, entre o abismo hiante das profundezas do Nada, a face de Deus pairando sobre as águas.
E disse Deus, haja luz. E houve luz. Por todos os céus estrelares penetraram as minhas vibrações incandescentes, aclarando os mais ínfimos vórtices de matéria. E luz houve, organizando o caos e banhando de claridade as trevas mais fundas do fundo sem fundo do universo. E com a luz, houve o Tempo, que desde então não cessou de se movimentar, consumindo-me a força vital. São os meus dois filhos, que me esgotarão a vida - o Tempo e o Movimento -, que patriarca um só tenho: Deus, meu Senhor e Criador. Eu, templo de matéria, seu escravo.
Chamou-me Deus à expansão da vida. Da luz nasce o calor, do calor a vida e a vida inundou a terra vazia e sem forma. Separou Deus o céu alvo e a terra escura e, como um berlinde nas mãos de uma criança, acionou a redonda terra, fazendo-a girar infinitamente até o longínquo limite dos tempos e das eras. Fui eu a primeira partícula a beijar de luz a sagrada terra, antes mesmo de esta para todo o sempre ser beijada pelo magnificente sol. Ao esplendor do sol chamou Deus dia e noite ao fulgor prateado da lua. E criou Deus os viventes do dia e os viventes da noite.
Eu, atraído pela potência do astro-rei, pairava a uma velocidade absoluta entre a terra e o sol, criando, na escuridão do vasto espaço gelado e imóvel, uma fímbria de luminosidade que atraiu o santo olhar divino. Por misericórdia, Deus libertou-me da minha prisão gravitacional. Senti-me projetado para a terra, arremessado para o centro da pupila de Adão, que, puro e virginal, lançava o primeiro olhar de desejo para as carnes roliças e ardentes de Eva.
Fonte: JL
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