22 agosto 2010

A descoberta das palavras

O idioma está entre as ferramentas mais complexas do ser humano. No entanto, crianças só precisam de uns poucos anos para aprender a pronúncia, o significado de milhares de palavras e como encadeá-las corretamente

Por Martin Paetsch

Com um ano e meio, as crianças começam a expandir rapidamente seu vocabulário. Em média, eles aprendem 9 palavras novas por dia. Aos 6 anos, já dominam 14.000 conceitos
“NÃO VOMITAR ÔNIBUS”, anotou a linguista Susan Curtiss. Ao lado, escreveu o significado da frase abreviada: “Eu não vomitei no ônibus”. Outras afirmações incluem “professor manda escola” ou “eu querer Curtiss tocar piano”. São palavras enfileiradas que poderiam facilmente ser pronunciadas por uma criança de 2 ou 3 anos.

Mas a autora dessas frases ingênuas não é uma criança. Ela já tem 17 anos quando as anotações são feitas. “Genie”, como a adolescente é chamada para proteger sua identidade, só conhece a fala há pouco tempo.

A garota escapou de seu martírio aos 13 anos. Desde a mais tenra idade, seus pais a haviam trancado em um quarto – durante o dia amarrada a uma cadeira-toalete; à noite imobilizada dentro de um saco de dormir. Ninguém jamais falou com ela e ela nunca havia escutado a fala humana nem por rádio ou televisão. Ao som do mínimo barulho, o pai a surrava com um pedaço de pau.

Quando essa “criança-lupina” é descoberta em Los Angeles, em 1970, ela só lembra de longe um ser humano. “Genie” pesa apenas 27kg, não consegue ficar ereta e praticamente não sabe andar. E não fala. Tudo o que suas cordas vocais produzem é um gemido agudo.

Susan Curtiss e outros pesquisadores se encarregam dela, na esperança de poder ajudá-la. Principalmente, porém, eles querem obter insights únicos em um dos maiores milagres da infância: o aprendizado da fala. Pois somente em raríssimos casos uma pessoa cresce em tão absoluto isolamento, sendo obrigada a lutar penosamente por aquela capacidade que parece ir naturalmente ao encontro de todas as outras.

Todas as crianças criadas em condições normais aprendem sua língua materna com a mesma naturalidade com que aprendem a andar. E, até mesmo bebês surdos começam a gesticular com as mãos naquele período de desenvolvimento em que outras crianças da mesma idade, que escutam, começam a balbuciar. Mais tarde, eles inventam os primeiros sinais, que finalmente aglutinam para formar frases bem simples, mesmo quando seus pais não lhes ensinaram a linguagem de sinais.

Até a idade adulta, um ser humano aprende, conforme a riqueza de seu vocabulário, entre 20.000 e 80.000 palavras. E, com a ajuda de regras gramaticais, consegue ordená-las em um número praticamente infinito de frases.

Mas é um enigma como as crianças se apoderam dessa ferramenta. Que mecanismos permitem a uma criança pequena identificar palavras isoladas no meio de uma cascata inicial de termos e sons desconhecidos? Como ela absorve e retém a complexa estrutura gramatical de uma língua? Por causa de perguntas como essas os pesquisadores e filósofos vêm brigando há muito tempo.

Pois a fala é uma característica intrinsecamente humana. Embora algumas espécies animais também disponham de um considerável talento para a comunicação, alguns primatas conseguem aprender símbolos ou sistemas de sinais, com os quais eles respondem a perguntas simples, nenhuma outra espécie chegou tão longe como o homem na arte de formular e trocar informações.

Um estudo mostra que crianças com menos de três anos tomam principalmente seus pais como modelos linguísticos. Pesquisadores especulam a razão disso: homens não estressariam os pequenos com uma verborreia e frases complexas, como muitas mães o fazem

NÃO SE SABE quando, no decorrer da evolução, ocorreu esse importante passo de desenvolvimento. Pesquisadores americanos constataram, com base em achados de esqueletos, que o Homo sapiens é dotado há pelo menos 50.000 anos de uma particularidade anatômica: a cavidade bucal e a goela (ou garganta, no caso) não formam mais um arco único, como em nossos ancestrais mais antigos, mas constituem um ângulo quase reto. Além disso, desde então a laringe se localiza em um ponto muito mais profundo da garganta. Desse modo, foi possível originar o espaço de ressonância no fundo da garganta e a língua ganhou mais espaço.

É essa formação especial da boca e da garganta que hoje permite emitir a multiplicidade de sons de um idioma; vale ressaltar que nossos parentes mais próximos, os hominídeos, não conseguiam fazer isso.

Entretanto, em recém-nascidos o trato vocal praticamente não se distingue do de outros mamíferos: é só por isso que os bebês conseguem simultaneamente mamar no peito materno e respirar. Durante o crescimento da criança ocorrem mudanças estruturais responsáveis por fazer com que a língua e a laringe escorregassem cada vez mais para trás, até que consiguisse, entre 6 e 8 anos de idade, produzir um número semelhante de sons vocais aos de um adulto.

Mas ela faz suas primeiras tentativas de falar muito antes disso. Dois meses após o nascimento, os bebês emitem sons guturais como grrr ou graa. Aos seis meses, eles começam a balbuciar e emendam sílabas formando estruturas sonoras, como bababa ou dadada.

Na idade de cerca de um ano, os bebês pronunciam suas primeiras palavras; seis meses mais tarde, eles já dominam 20 palavras e, a partir daí, eles aprendem, em média, 9 palavras novas por dia.

Simultaneamente, eles começam a formular frases simples de duas palavras, como “boneca vem” ou “mais leite”. Aos quatro anos, muitas crianças já têm um vocabulário de mais de 6.000 palavras e, frequentemente já formulam perguntas e frases complexas gramaticalmente corretas.

COMO, EXATAMENTE, esse estonteante processo de aprendizado transcorre ainda é uma questão debatida entre os cientistas. Em 1957, o psicólogo americano Frederic Skinner tentou apresentar uma explicação. Ele partiu do princípio de que, cada comportamento, inclusive a fala, é adquirido e retido por meio de confirmações externas.

Sendo assim, uma criança só seria recompensada com um suco, quando ela pronunciasse uma frase articulada, como “quer suco”. Desse modo, segundo Skinner, aos poucos predominariam na fala infantil palavras pronunciadas corretamente e frases gramaticalmente certas, enquanto as variantes incompreensíveis, não recompensadas, simplesmente desapareciam.

Descobertas feitas na prática psicológica falam a favor da teoria de Skinner, pois terapias que se baseiam em seu conceito de condicionamento, podem ajudar crianças debilitadas a aprender a falar.

Entretanto, experimentos não levam necessariamente a conclusões sobre o processo de aprendizado em bebês saudáveis, uma vez que, em casos normais, a fala não é ensinada e treinada sistematicamente pelos pais. O que de fato ocorre é que as crianças são expostas a um confuso ambiente de sons, de vozes diferentes e comentários desconexos, pois somente poucas pessoas conversam por meio de frases completas. Hoje, os pesquisadores julgam impossível que uma criança possa desenvolver uma compreensão mais profunda da fala apenas com base nesses estímulos fragmentados, em vez disso, eles acreditam que ela já esteja equipada, desde o nascimento, para essa difícil tarefa de aprendizagem.

CADA VEZ MAIS estudos científicos mostram que crianças dispõem de mecanismos surpreendentemente eficientes para poder reconhecer sons, palavras e possivelmente até estruturas gramaticais, embora essas estratégias pouco ou nada tenham a ver com o condicionamento descrito por Skinner. Na realidade, tratam-se de mecanismos que já ajudam recém-nascidos a colocar ordem no penetrante caos de cliques, chiados, zumbidos e ruídos resmungados que os cercam.

A multiplicidade de ruídos humanos é avassaladora. Em conjunto, todas as línguas do mundo dispõem de um repertório de 600 consoantes e 200 vogais, o que, na combinação de 5 sons por palavra, por exemplo, resulta em 100 trilhões de possibilidades.

As fases de aprendizado da fala

Crianças aprendem a falar com rapidez variável. Aos dois meses, em média, os bebês começam a explorar sons involuntários, como grrrr ou graaa, que brotam de movimentos musculares aleatórios da boca, do pescoço e da laringe. A partir do sexto mês, começa a fase dos balbucios com sílabas encarreiradas (mamama, dadada). O ritmo e a cadência desses monólogos já se parecem com a língua materna. Por volta dos nove meses, o bebê já sabe direcionar conscientemente os movimentos de sua boca para formar uma única sílaba dupla. Quando os pais o elogiam por isso, ele aos poucos começa a aprender a diferenciar palavras que fazem sentido em cadeias sonoras aleatórias. A partir de doze meses, a criança formula as primeiras chamadas protopalavras (por exemplo, auau). De início, elas são utilizadas seletivamente, somente uma determinada bola é ‘bola’, em uma fase posterior, qualquer homem pode ser ‘papai’.

Na idade de um ano e meio, ocorre uma verdadeira explosão vocabular. Logo em seguida, a criança começa a formar as primeiras frases de duas palavras e então tem início a idade das eternas perguntas (“pota abeta?”). Aos poucos, as crianças se tornam mais habilidosas e passam a declinar verbos, formar plurais e sentenças mais longas. Aos três anos, mais ou menos, tem início a segunda fase de perguntas (“por quê?”, “que é isso?”). Por volta dos quatro anos, a maioria das crianças já domina os fundamentos gramaticais e, paralelamente, a riqueza de vocabulário se expande. O cérebro armazena noções e aspectos adicionais em um “dicionário mental”. Por exemplo: “sapo = bicho = liso = coaxar” .

Aos seis anos, a criança sabe rimar e fazer separações silábicas de palavras, capacidades fundamentais para aprender a ler e escrever. E, com isso, os alicerces do aprendizado estão completos
Quando ainda bem pequenas, todas as crianças são capazes de diferenciar esses sons. Em estudos científicos, bebês de seis meses de idade, do espaço idiomático da língua inglesa, reagiram a contrastes de entonação típicos do idioma falado pelos índios nlaka’pamux, do Canadá enquanto adultos de língua inglesa praticamente já não registravam mais essas sutilezas.

Mas os bebezinhos, de início universalmente talentosos, se acostumam cedo na vida aos sons da língua materna. Nesse processo, eles também conferem a mesmíssima categoria sonora, às pronúncias variáveis entre si, por exemplo, de diversos interlocutores. Bebês americanos, de seis meses de idade, já tendiam a interpretar como idênticas diversas variantes de uma vogal em inglês, mas já não faziam essa diferenciação com as variantes de uma vogal sueca.

Desse modo, o sentido auditivo se especializa, pouco a pouco, naquelas 40 categorias sonoras que são mais importantes na respectiva língua materna.

Adultos japoneses, por exemplo, certamente produzem variantes de sons que correspondem às consoantes ocidentais r e l, mas eles sempre compreendem e querem dizer apenas a mesma consoante em seu idioma. Da mesma forma, bebês japoneses de um ano já têm dificuldade em diferenciar esses dois sons. Paralelamente, nessa idade eles já melhoraram muito a sua capacidade de identificar essa consoante japonesa em particular, bem como outros sons típicos.

Mas, além disso, o bebê também precisa aprender a identificar palavras isoladas. Não é fácil descobrir onde elas começam e onde terminam na língua falada: um orador raramente faz pausas claras que possam servir como pontos de referência. Em vez disso, ele frequentemente emenda as palavras em um fluxo contínuo de sílabas.

Mesmo assim, algumas crianças já entendem algumas palavras muito antes de começarem a falar: em testes, aos 6 meses, eles olharam muito mais tempo para a imagem de suas mães em vídeos experimentais quando alguém lhes perguntava “cadê mamãe?”. O mesmo aconteceu quando se pronunciava a palavra “papai”.

Aos 13 anos, a garota americana “Genie”, da Califórnia, conseguiu escapar de seu martírio: os pais a tinham trancafiado desde a mais tenra idade sem jamais falar com ela. Depois que “Genie” foi descoberta, em 1970, pesquisadores tentaram ensiná-la a falar, mas para isso, segundo um dos cientistas, a “criança mais testada da história” já estava crescida demais
Outro estudo explica como os nenês aprendem a identificar palavras como essas no fluxo idiomático: pesquisadores americanos confrontaram bebês de 8 meses durante dois minutos com um ininterrupto fluxo de sílabas apresentado por uma voz digital. A sequência dos sons, por exemplo, bidakupadotigolabubidaku, era formada por palavras inventadas, aleatoriamente emendadas, como padoti ou golabu.

Quando os cientistas reapresentaram essa criação de palavras fantasiosas em meio a outras novas e desconhecidas, os bebês deram sinais evidentes de reconhecer aqueles sons conhecidos. De acordo com isso, eles já sabiam identificar a palavra padoti e outros termos artificiais já ouvidos antes.

Aparentemente, os bebês se valeram de frequências estatísticas. Por exemplo, eles identificaram com frequência muito maior a combinação silábica pa-do, como parte integrante da palavra padoti, enquanto ti-go aparecia muito mais raramente, apenas na combinação padoti golabu. Esse é um princípio pelo qual também se identificam palavras na linguagem real: nas frases “quer boneca” e “dar boneca”, a sequência silábica bo-ne-ca aparece com maior frequência que er-bo ou ar-bo.

Cochichar, repetir: a fala é um instrumento potente. Mas quem fala desinibidamente diante dos outros também se sente poderoso. Por isso, em muitas escolas, as crianças são estimuladas a participar de apresentações e peças teatrais

É prejudicial para uma criança crescer falando mais de um idioma?
Não. Na Nigéria, por exemplo, existem mais de 400 línguas diferentes; portanto a maioria de seus habitantes é poliglota. Os escandinavos frequentemente também dominam vários idiomas. Para crianças, a diversidade idiomática em geral não constitui problema. Às vezes, elas podem demorar mais a aprender quando o pai e a mãe falam línguas diferentes, mas elas logo recuperam esse atraso. E, quando uma criança adquire na infância um segundo idioma, ela absorverá outros com facilidade muito maior que outras da mesma idade, que cresceram em ambientes monolíngues. O que não se recomenda, porém, é que os pais se comuniquem com os filhos digamos, em inglês, se eles mesmos não dominam perfeitamente essa língua estrangeira.

Em situações normais de fala, os modelos típicos de entonação de qualquer idioma ajudam as crianças: uma sílaba acentuada pode, por exemplo, indicar o início de uma palavra que o bebê reconhecerá com mais facilidade. Além disso, a criança recebe indicações importantes de seus pais, pois no mundo inteiro estes adotam uma forma de expressão especial quando falam com bebês ou crianças muito pequenas. Nesse procedimento, eles frequentemente exageram a melodia da frase e prolongam acentuadamente as vogais, essa articulação pronunciada permite que o bebê aprenda a diferenciar sons e palavras.

PARA REALMENTE entender uma língua, porém, a criança precisará se esforçar muito mais. Além de compreender palavras, ela terá de aprender a associar suas relações gramaticais. Mas, como ela aprende que uma palavra é um substantivo, um verbo ou um objeto? Como ela é capaz de reconhecer em uma frase inventada, como “Nani cocula Nana”, que Nani está fazendo alguma coisa em relação a Nana embora não possa, possivelmente, imaginar ou saber o que é cocular?

Para que os alunos devem estudar Gramática?

A matéria “Gramática” é tão detestada quanto Cálculo Integral. Apesar disso, quem entende alguma coisa sobre a estrutura das línguas sabe mais sobre o modo e o mecanismo como o nosso cérebro divide o mundo em categorias. E aprende a valorizar que maravilha é a comunicação humana. Pois ela passa pela fascinante experiência de conseguir enxergar além de um complexo conjunto de regras, que até então empregou fluentemente, sem saber como era bom nisso

 
Sabe-se, porém, que nenês bem pequenos já dispõem de alguma forma de compreensão gramatical. Pesquisadores mostraram a bebês de um ano e meio, que só se comunicavam por meio de palavras simples, dois filmes simultâneos com personagens de Vila Sésamo, em dois aparelhos de TV. Em um monitor, o pássaro Garibaldo cutuca o monstro Come-Come; no outro ele mesmo é cutucado.

Então, as crianças eram verbalmente estimuladas com frases como: “Olha! O Garibaldo cutuca o Come-Come! Ache o Garibaldo que cutuca o Come-Come”. Aparentemente, a criançada compreendia a estrutura frasal de sujeito, verbo e objeto, pois elas olhavam com mais frequência para o monitor em que o pássaro cutucava o monstro.

As frases simples também só fazem sentido para uma criança quando ela é capaz de estabelecer relações entre palavras bem distantes entre si, como entre o sujeito Garibaldo, no início da sentença, e o objeto, Come-Come, no fim da frase. Além disso, o cérebro da criança tem de ser capaz de generalizar esses modelos gramaticais. Portanto, essa estrutura frasal não vale apenas para Garibaldo e Come-Come, nem só para cutucar.

O fato de crianças aprenderem esses vínculos gramaticais de um modo extremamente rápido é sugerido por mais um experimento. Nele, os pesquisadores desenvolveram duas línguas artificiais, que se baseavam no mesmo vocabulário, mas em gramáticas bem distintas. Os cientistas então tocavam para bebês de um ano frases construídas conforme a gramática do primeiro idioma, em média durante apenas um minuto aproximadamente.

Depois desse breve período de treinamento, os bebês eram confrontados com frases novas, construídas com outras palavras artificiais, algumas delas baseadas na segunda forma gramatical. Nesse exercício, as crianças prestavam mais atenção quando os alto-falantes emitiam novas formas da primeira estrutura gramatical, já utilizada no primeiro treinamento. Aparentemente, os bebês eram capazes de diferenciar entre as duas estruturas de regras gramaticais; portanto, eles reconheciam os princípios da gramática escutada em primeiro lugar.

Experimentos desse gênero mostram que crianças avaliam de forma muito surpreendente o intenso fluxo de conversas que as cercam. E elas parecem extrair dele não apenas informações sobre os limites entre diversas palavras distintas, mas também sobre regras gramaticais: uma sugestão considerada impensável pelos defensores do conceito de uma “gramática universal”; ou seja, a noção de que pelo menos princípios gramaticais básicos são inatos.

O contato com crianças da mesma idade, por exemplo, no jardim de infância, é fundamental para a expansão do vocabulário. O fato de ocasionalmente também aprenderem palavrões não deve alarmar os pais, pois essas expressões fortalecem a autoconfiança infantil
DE QUALQUER MODO, tudo indica que o aprender a falar é um processo unificado, que envolve simultaneamente um direcionamento genético e influências externas.

Os pré-requisitos externos incluem o ambiente social que cerca a criança. Apenas escutar frases por um alto-falante certamente é insuficiente, como mostra o caso de um menino americano de audição normal, porém filho de pais surdos. Até os três anos de idade, ele aprendeu sua língua materna principalmente através da televisão e, embora soubesse se expressar em inglês, sua compreensão gramatical era severamente subdesenvolvida.

Consequentemente, as tentativas de alguns pais, de estimular o conhecimento de seus filhos pequenos em línguas estrangeiras por meio de cursos de áudio, geralmente são infrutíferas.

Isso porque, o processo de aprendizado envolve outro fator muito importante, além do calor humano: tempo. Ao que tudo indica uma língua só se aprende sem esforço na mais tenra infância. Durante o primeiro ano de vida até crianças que tiveram a região cerebral responsável pela fala afetada por acidentes graves, geralmente conseguem desenvolver uma capacidade plenamente normal; enquanto isso raramente acontece com adultos.

Estudos realizados em imigrantes chineses e coreanos nos Estados Unidos também sugerem a existência de um período crítico para o aprendizado de um idioma. Todos os imigrantes que chegaram aos EUA após o sétimo ano de vida, jamais conseguiram dominar completamente o inglês, independentememte de quanto tempo estudaram o idioma.

A história de “Genie”, a criança-lupina moderna, também ilustra isso tragicamente. Embora ela aprendesse a falar por meio de um treinamento intensivo, após anos de isolamento, e adquirisse um vocabulário de cerca de 100 palavras, a menina curiosa jamais passou do nível intelectual de uma criança muito pequena.

Tudo indica que no momento em que “Genie” começou a ter aulas já era tarde demais. Ela nunca conseguiu conjugar a forma passiva de um verbo, nem formular perguntas gramaticalmente corretas.

Depois de ter recebido cuidados e atenção no âmbito de um projeto de pesquisa de quatro anos de duração, as subvenções financeiras estancaram em 1975. E “Genie”, que até então vivera na família de um dos cientistas, foi dada em adoção. Ali ela foi novamente submetida a maus tratos: sempre que vomitava, por exemplo, ela era castigada.

Pouco depois disso “Genie” emudeceu. Hoje ela vive em um asilo particular e, à exceção de algumas poucas palavras, nunca mais utilizou aquele primeiro idioma tão penosamente aprendido e que, para a maioria de nós, é a coisa mais natural do mundo.

Meu filho ainda fala normal?

Muitas vezes, bastam medidas estimulantes simples quando o desenvolvimento da fala é mais lento. Em menos da metade de todas as crianças afetadas, que podem ser provenientes de todas as camadas sociais, o problema é fruto de algum distúrbio específico na destreza idiomática. Essas crianças podem ter dificuldades consideráveis com vocabulário, gramática, pronúncia e até compreensão. As razões disso não são muito claras, pois nesses casos não existem indícios de distúrbios cerebrais ou auditivos e, muito raramente, de problemas emocionais. Os especialistas que tratam de distúrbios da fala são os fonoaudiólogos e os logopedistas. Comparativamente, os distúrbios da voz e da fala são mais fáceis de resolver. Neles, a formação de sons não funciona direito. Quando uma criança tem dificuldades para pronunciar determinados sons (dislalia, perturbação na articulação de palavras por lesão de algum dos órgãos fonadores), os logopedistas têm alguns truques para abordar a problema: quem, por exemplo, tem dificuldades para pronunciar o k, deve jogar uma bola com força para longe de si ao pronunciar a articulação. Além disso, o paciente deve fazer exercícios bucais: chupar balas com um canudo ou lamber geleia do lábio superior. A gagueira também é um distúrbio da fala, cuja origem frequentemente é psicológica. Aos dois ou três anos de idade, o gaguejar é frequente no âmbito do desenvolvimento normal da fala e, nessas circunstâncias, os pais não devem exercer nenhuma pressão. Brincar com bonecas pode ajudar, pois nessas ocasiões as crianças mergulham em outros papéis e gaguejam menos ou nada. Uma das consequências muito difundidas de distúrbios do desenvolvimento da fala é a legastenia (disfunção dos movimentos oculares que afeta o desempenho nas tarefas de leitura e escrita. Para muitos pesquisadores é sinônimo de dislexia e faz com que crianças afetadas troquem letras ao ler e escrever, não conseguindo compreender frases inteiras). Em geral, o problema, de ordem genética, é acentuado por falta de treinamento e televisão em excesso. Quando crianças de 3 anos só dominam algumas poucas palavras, recomenda-se com urgência uma terapia

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