Se assinalam os 125 anos da sua edição(Os Maias) e uma iniciativa Expresso (Eça Agora) veio chamar a atenção para a obra e a efeméride. De facto, o conhecido semanário oferece o romance, em très edições consecutivas, a que se seguirão, em outras três edições, textos de seis escritores atuais que "trazem" Os Maias até 1973- e um sétimo e último volume sairá um estudo, sobre o romance, do reputado especialista queirosiano Carlos Reis. Maria do Rosário Cunha, falará sobre a futura edição crítica de Os Maias. Kyldes Batista Vicente, sobre a minissérie da TV Globo que os teve por base- enquanto se lembram também suas adaptações ao teatro (bem como a falhada tentativa do próprio Eça), com o testemunho da encenadora Filomena Oliveira. E ainda o que pretende ser uma sua próxima adaptação ao cinema, em entrevista com o realizador João Botelho.
Maria Eduarda for ever!
José-Augusto França
Maria Eduarda é, sem antes nem depois, a heroína do romance português, por excelência sua, do seu autor e no que dramaticamente pode ser entendido no Portugal (ou na Lisboa) do Romantismo, já em perda realista de Fontismo. Isto é, nos anos 1880 de entre o "Santanário" de Camões e o Ultimatum. Como soube perceber, acho eu, um certo Conselheiro Adalberto Martins de Sousa, em Memórias encontradas que vão vir a lume. Quando, depois do "curto rompante de luxo barato" da Avenida e das paragens fluviais do Aterro, e quando o turf mudara de luxos para o Chiado, em 1888 (com alguma colisão de datas próximas, na narração então terminada), Carlos voltou, em visita, à pátria da "língua da libra" e "dos sindicatos", diz o Alencar.
Maria Eduarda era já então Madame de Trélain- e em vão eu próprio pus a filha Rose em Madame d'Amécourt, Mademoiselle de Saint-Postou que fora, a encontrar Eça nos "Variétés", já no fim do século, num entreato da La Belle Lurette. Notícias de "Madame votre mère?" Bem, só o coração, uma pequena malformação, "rien de grave"...Assim do coração malformado (de nascença, veja-se), Maria Eduarda discretamente padecia, como convinha, simbolicamente ao seu passado de amor intenso, e impossibilidade final...
Nesse amor e nessa impossibilidade se cruzou o par Maria e Carlos, que se formou na Lisboa de 1880-"amantes malditos" em "amor de perdição", a meio século de distância ( e estando ainda vivo quem o descreveu, em 1862) foi o deles os dois. Outro não haveria ou poderia haver, entre o Grémio e S. Carlos, da Gouvarinho ou da Abranhos, da prima Luísa ou da pobre Amélia da Leiria do Padre Amaro, ou da priminha das Serras, em casamento reconhecido- que outros exemplos Eça não deu, nem o seu próprio; nem o dos pais, entre ajuste mundano e oficial e drama doméstico de imprevidência.
Neste "romance de aprendizagem", "educação sentimental", foi Eça o romancista do amor mais autêntico que em Portugal tivemos, até ao melancólico desamor. Prefiro não falar aqui da Menina e Moça "alternativa", em jogo de reflexos, do poeta Bernadim, numa história em 89 capítulos, inconclusiva e assim moderna, afinal. E tão o foi quanto a de Maria e Carlos, no arrumar das suas vidas( ou des-vidas, como é corrente; todos os romancistas o sabem e praticam, tanto quanto podem). Porque, no Portugal em que nasceram, só entre eles, na sua categoria física (a bela entrada real de Maria, no átrio do Hotel Central: não há filme que no-la encene) podia haver tal amor...
O suicídio de Ana Karenina ou de Madame Bovary, trágico e nobre ou sórdido e pequeno-burguês, não podia ser para aqui chamado, em catástrofe que a boa educação de "vencido da vida" proibia. Mas o desenlace, após a crise tragicómica, não foi menos terrível, em mansa nostalgia...
Maria Eduarda terá tido modelo angevino fotografado, no preciso momento (isso está documentado) em que Eça compunha e recompunha Os Maias? Não há especialista ( e tantos são!) que o confirme ou analise, nem biograficamente o queira saber, em Angers, como necessário parece ser.
De qualquer modo, neste aniversário esdrúxulo de 125 anos d'Os Maias - Maria Eduarda for ever, e única!
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