08 julho 2013

Outras Estantes: Questionário queirosiano a José Luís Peixoto


"Eça Agora" é uma coleção que o Expresso vai oferecer. Além de "Os Maias" inclui a sua continuação e um livro de estudo
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O Expresso começa a distribuir na próxima semana a coleção "Eça Agora". São sete volumes dedicados a celebrar a obra de Eça de Queirós - "Os Maias" foram publicados há precisamente 125 anos - bem como o 40º aniversário do Expresso. 

José Luís Peixoto é um dos seis escritores escolhidos para continuar "Os Maias", num exercício literário em que cada um explora determinado período histórico, de forma a transportar a narrativa até aos dias da fundação do Expresso, em 1973. Estes novos capítulos compõem os três volumes de "Os Novos Maias".

Questionário queirosiano a José Luís Peixoto
A literatura de Eça é, para o bem e para o mal, "traduzida do francês"? 

Não sinto que seja mais "traduzida do francês" do que, hoje, muita literatura portuguesa é "traduzida" de outras línguas, nomeadamente do inglês. Não se pode fugir da história. Cada período tem as suas hegemonias e referências. São uma parte do contributo para as características das obras de determinada época. Fazendo-o de um modo que nem sempre é fácil de avaliar nesse presente. Eça escreveu em português. Fê-lo de uma forma que é, a todos os níveis, um marco na literatura deste país, desta língua.

A constante ironia de Eça é um dos seus grandes méritos ou uma das suas principais limitações, por comparação com o trágico e o patético de Camilo, por exemplo? 

O trabalho narrativo de Eça, o seu génio, ultrapassa largamente a elegância certeira com que usou a ironia, apesar de essa ser uma qualidade assinalável. Da mesma forma, o trabalho de Camilo é muito mais múltiplo do que apenas a sua dimensão trágica. É, aliás, muito fácil encontrar marcas trágicas em Eça e marcas irónicas em Camilo. Assim, creio que o principal mérito que encontro em Eça é a sua obra, a totalidade, com a subjetividade das suas forças e fragilidades, recusando-me a resumi-la aos estereótipos, o que é sempre redutor.

Existe um "segredo" em "Os Maias": é um estratagema de época, que envelheceu mal, ou continua um recurso atual? 

Os segredos, com ou sem aspas, são recursos muito úteis na construção de uma narrativa de fição. O dito "segredo" de "Os Maias" é bastante atual, tanto mais que continua a encontrar-se em diversas obras contemporâneas enquanto tema. Acrescentando-se a curiosidade de, hoje em dia, haver autores de grande nível, não tanto na literatura portuguesa, que aspiram justamente àquilo que foi o romance do século XIX, no qual o nome de Eça se inscreve com toda a justiça.

"Ainda o apanhamos", dizem os dois amigos na última página do romance; é essa esperança desesperançada que torna "Os Maias" tão português? 

Não creio. As marcas portuguesas são inúmeras em "Os Maias" e superam largamente esse detalhe. Pela minha parte, até acredito que Carlos e Ega apanharam mesmo o "americano". Esse é, pelo menos, um dos pressupostos do texto que escrevi para este desafio.

Poucos romances portugueses são tão "cinematográficos" e tão dependentes, nomeadamente, do advérbio de modo; a escrita de "Os Maias" é "visual" ou "estilística"?

É um romance tão rico que, parece-me, pode ser considerado nessas duas vertentes. Há episódios e elementos que podem ser colocados de um e de outro lado dessas possibilidades.



Fonte: Jornal Expresso

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