Os Estados Unidos Contra John Lennon celebra o Beatle politizado
By: Rodrigo de Oliveira
Para os fãs dos Beatles, 8 de dezembro de 1980 é uma data que traz péssimas lembranças. Curiosamente, esse sentimento é compartilhado até mesmo por pessoas que nem haviam nascido na época e que, em tese, não sofreriam tanto com os acontecimentos daquele fatídico dia. A data marca o assassinato de John Lennon, ao lado da mulher que tanto amava e na sua adorada Nova York. A morte do homem que, em seu repertório, pregava a paz (“Give Peace a Chance”), imaginava um mundo sem fronteiras (“Imagine”) e que mal podia esperar para ver o filho crescer (“Beautiful Boy”).
Entre o fim dos Beatles e o final trágico de John Lennon passaram-se apenas 10 anos. E é basicamente durante esse período que se concentra o documentário “Os Estados Unidos Contra John Lennon”, dirigido pela dupla David Leaf e John Scheinfeld.
A demora para a chegada deste filme no Brasil é inacreditável – foi lançado em 2006 nos EUA. Felizmente, a espera vale a pena. Emotivo e muito bem montado por Peter S. Lynch, “Os Estados Unidos Contra John Lennon” coloca uma luz sobre o período ativista do músico, fazendo um rico apanhado de imagens de arquivo e depoimentos atuais.
David Leaf e John Scheinfeld, diretores experimentados em documentários musicais, tendo assinado juntos “Bee Gees: This is Where I Came In (2000) e “Vintage Sinatra” (2003), se mostram bastante a vontade ao contar a história do ex-Beatle, construindo um filme que não agradará apenas aos fãs do músico.
Os diretores contextualizam o espectador logo de início, mostrando a veia revolucionária de John Lennon desde sua tenra infância. O músico sempre se meteu em confusões, desde a adolescência, e o fato de fundar uma das bandas mais bem conceituadas de todos os tempos não o aquietou por muito tempo. Frases como “Somos mais famosos que Jesus Cristo” ou a música “Revolution” já mostravam que polêmica e consciência política corriam nas veias do rapaz.
Foi ao conhecer e se apaixonar pela artista plástica Yoko Ono que John começou a seguir um caminho mais politizado – e perigoso. Antes mesmo do fim dos Beatles, concertos como o Peace Toronto Festival, no Canadá, ou seus protestos pacifistas Bed Peace, Hair Peace começaram a chamar a atenção da opinião pública sobre a inclinação do músico como contestador.
Quando a banda terminou, John teve ainda mais chances de se mostrar contrário ao mundo bélico que o cercava, escrevendo músicas de protesto e criando amizades com polêmicos líderes idealistas como John Sinclair (empresário da banda MC% e líder dos militantes de esquerda Panteras Brancas), Jerry Rubin (líder das demonstrações anti-Guerra do Vietnã e fundador do Partido Internacional da Juventude) e Bobby Seale (fundador do grupo radical Panteras Negras).
Não demorou muito para que o paranóico governo dos Estados Unidos concluísse que John Lennon era uma ameaça e que a deportação do músico era a única saída para resolver o problema. Mas John e Yoko amavam Nova York e não sairiam dali sem lutar.
Os diretores do documentário conseguem depoimentos valiosos de personalidades que viveram a época e tiveram contato direto e indireto com a situação do ex-Beatle. Os destaques ficam para figuras como John Sinclair (cuja prisão inspirou John Lennon a criar uma música de protesto com seu nome), o jornalista Carl Bernstein (que investigou e denunciou a podridão do governo de Richard Nixon, um dos principais interessados na deportação do músico), o ex-senador George McGovern (político que concorreu à presidência contra Nixon, apoiado por Lennon), Leon Wildes (advogado de imigração que defendeu o casal contra a tentativa de deportação) e, claro, Yoko Ono. A viúva dá sua visão única sobre aqueles anos turbulentos que passou ao lado de John e suas criativas idéias de como combater a violência completamente desarmada.
Em um dos trechos mais contundentes do documentário, uma repórter coloca John e Yoko contra a parede, perguntando o que haviam realmente feito para terminar com a guerra do Vietnã. Lennon tenta explicar que sua música é ouvida por muitos e que isso faz diferença, fato que a jornalista rechaça com ironia.
Olhando em retrospecto, é muito mais fácil entender que as atitudes de John tinham propósito real. Como músico, o que poderia ele fazer senão criar canções? Músicas como “Give Peace a Chance”, “Happy Xmas (War is Over)”, “Imagine” e “Power to the People” mostram um músico preocupado com o mundo e que tinha como missão colocar seu trabalho à disposição da paz.
O resultado final, curiosamente, carece de depoimentos de seus ex-parceiros de banda, Paul McCartney e Ringo Starr. É verdade que McCartney e Lennon não eram tão próximos nos anos 70, tendo brigado publicamente através de canções em seus discos. No entanto, seria interessante ouvir sua visão sobre os acontecimentos da época, mesmo que à distância. Uma curiosa omissão, que nem assim diminui o impacto. Basta ouvir o riff de “Revolution” saindo de um bom sistema de som para entender porque os fãs não podem perder essa estreia.
http://www.youtube.com/watch?v=xBUo2mP5bpA&feature=player_embedded
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